quarta-feira, 13 de abril de 2011

Nós, por nós mesmos

Crônica de Marta Medeiros

Depois de um bom tempo dizendo que eu era a mulher da vida dele, um belo dia eu recebo um e-mail dizendo: 'olha, não dá mais'.
Tá certo que a gente tava quase se matando e que o namoro já tinha acabado mesmo, mas não se termina nenhuma história de amor (e eu ainda o amava muito) com um e-mail, não é mesmo?
Liguei pra tentar conversar e terminar tudo decentemente e ele respondeu: mas agora eu to comendo um lanche com amigos'. Enfim, fiquei pra morrer algumas semanas até que decidi que precisava ser uma mulher melhor para ele. Quem sabe eu ficando mais bonita, mais equilibrada ou mais inteligente, ele não volta pra mim?
Foi assim que me matriculei simultaneamente numa academia de ginástica, num centro budista e em um curso de cinema. Nos meses que se seguiram eu me tornei dos seres mais malhados, calmos, espiritualizados e cinéfilos do planeta. E sabe o que aconteceu? Nada, absolutamente nada, ele continuou não lembrando que eu existia.
Aí achei que isso não podia ficar assim, de jeito nenhum, eu precisava ser ainda melhor pra ele, sim, ele tinha que voltar pra mim de qualquer jeito!
Pra isso, larguei de vez a propaganda, que eu não suportava mais, e resolvi me empenhar na carreira de escritora, participei de vários livros, terminei meu próprio livro, ganhei novas colunas em revistas, quintupliquei o número de leitores do meu site e nada aconteceu. Mas eu sou taurina com ascendente em áries, lua em gêmeos, filha única! Eu não desisto fácil assim de um amor, e então resolvi tinha que ser uma super ultra mulher para ele, só assim ele voltaria pra mim.
Foi então que passei 35 dias na Europa, exclusivamente em minha companhia, conhecendo lugares geniais, controlando meu pânico em estar sozinha e longe de casa, me tornando mais culta e vivida. Voltei de viagem e tchân, tchân, tchân, tchân: nem sinal de vida.
Comecei um documentário com um grande amigo, aprendi a fazer strip, cortei meu cabelo 145 vezes, aumentei a terapia, li mais uns 30 livros, ajudei os pobres, rezei pra Santo Antonio umas 1.000 vezes, torrei no sol, fiz milhares de cursos de roteiro, astrologia e história, aprendi a nadar, me apaixonei por praia, comprei todas as roupas mais lindas de Paris.
Como última cartada, para ser a melhor mulher do planeta, eu resolvi ir morar sozinha. Aluguei um apartamento charmoso, decorei tudo brilhantemente, chamei amigos para a inauguração, servi bom vinho e comidinhas feitas, claro, por mim, que também finalmente aprendi a cozinhar. Resultado disso tudo: silêncio absoluto.
O tempo passou, eu continuei acordando e indo dormir todos os dias querendo ser mais feliz para ele, mais bonita para ele, mais mulher para ele.
Até que algo sensacional aconteceu...
Um belo dia eu acordei tão bonita, tão feliz, tão realizada, tão mulher, que eu acabei me tornando mulher DEMAIS para ele. Ele quem mesmo???
Martha Medeiros

Colegas
O texto versa sobre desamores, mas cabe nas diversas outras situações de rompimento: amizade, emprego...
Embora a personagem seja feminina, também cabe às diversas outras opções.
Quantas vezes já nos encontramos em situações semelhantes? Quantas vezes nos sentimos pequeninos, por termos permitido que assim nos tornassem?
Mas, sempre existe a volta por cima.
Aproveitem!
Um beijo.
Vera Maria

3 comentários:

  1. Cara professora, sempre tenho uma história para contar, mas dessa vez seu texto bateu com uma amiga minha, ela teve uma decepção por esses dias, nossa calhou, por telefone li o texto, riu muito e disse que realmente foi pra ela, mas que vai ser difícil encarar a realidade e a verdade, mas vai tentar ser essa LINDA MULHER. Como o meu papel é de amiga, estou sempre presente, por que não vivemos sem amigos pra nos ajudar nas piores horas, então compartilhei esse testo de Martha Medeiros.
    Valeu pela dica...

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  2. Na vida estamos todos sujeitos de viver uma situação com essa, porém não podemos
    esquecer quem somos nossos valores e lembrar antes de amar alguém amar a si mesmo .

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  3. Ler a crônica de Marta Medeiros me fez lembrar o livro "Perdas e Ganhos" de Lya Luft que no auge dos seus 70 anos, como não podia deixar de ser, esbanja sabedoria e nos dá preciosos exemplos de tudo o que perdemos e ganhamos durante nossa caminhada.
    Quando terminei a leitura passei a pensar em minhas privações e conquistas. Cheguei a algumas conclusões:
    Perdemos liberdade quando resolvemos nos unir e dividir nossa vida com alguém. Ganhamos companhia.
    Perdemos algumas noites de sono tranquilo quando decidimos ter filhos. Ganhamos sorrisos encantadores.
    Com o passar dos anos perdemos o frescor da juventude. Ganhamos serenidade.
    A personagem da crônica "perdeu" o que ela considerava um grande amor, porém conquistou novos horizontes, expandiu seus conhecimentos e se reconquistou. Reencontrou-se e ganhou o novo.
    Sempre que sentir a dor de uma perda, pare e pense nos possíveis ganhos que as ausências lhe trarão.
    Forte abraço,
    Luciana Fernandes.

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